segunda-feira, 5 de março de 2012

Poemas

O girino é o peixinho do sapo.O silêncio é o começo do papo.O bigode é a antena do gato.O cavalo é pasto do carrapato.O cabrito é o cordeiro da cabra.O pescoço é a barriga da cobra.O leitão é o porquinho mais novo.A galinha é um pouco do ovo.O desejo é o começo do corpo.Engordar é tarefa do porco.A cegonha é a girafa do ganço.O cachorro é um lobo mais manso.O escuro é a metade da zebra.As raizes são as veias da seiva.O camelo é um cavalo sem sede.Tartaruga por dentro é parede.O potrinho é o bezerro da égua.A batalha é o comço da trégua.Papagaio é um dragão miniatura.Bactérias num meio é cultura.
                                                                      "Arnaldo Antunes".

TRADUZIR-SE
Ferreira Gullar

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?


Procura da Poesia
 "Carlos Drummond de Andrade"

Não faças versos sobre acontecimentos.

Não há criação nem morte perante a poesia.

Diante dela, a vida é um sol estático,

não aquece nem ilumina.

As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.

Não faças poesia com o corpo,

esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.



Tua gota de bile, tua careta de gozo ou dor no escuro

são indiferentes.

Não me reveles teus sentimentos,

que se prevalecem de equívoco e tentam a longa viagem.

O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.



Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.

O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.

Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.



O canto não é a natureza

nem os homens em sociedade.

Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.

A poesia (não tires poesia das coisas)

elide sujeito e objeto.



Não dramatizes, não invoques,

não indagues. Não percas tempo em mentir.

Não te aborreças.

Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,

vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família

desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.



Não recomponhas

tua sepultada e merencória infância.

Não osciles entre o espelho e a

memória em dissipação.

Que se dissipou, não era poesia.

Que se partiu, cristal não era.



Penetra surdamente no reino das palavras.

Lá estão os poemas que esperam ser escritos.

Estão paralisados, mas não há desespero,

há calma e frescura na superfície intata.

Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.



Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.

Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.

Espera que cada um se realize e consume

com seu poder de palavra

e seu poder de silêncio.

Não forces o poema a desprender-se do limbo.

Não colhas no chão o poema que se perdeu.

Não adules o poema. Aceita-o

como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada

no espaço.



Chega mais perto e contempla as palavras.

Cada uma

tem mil faces secretas sob a face neutra

e te pergunta, sem interesse pela resposta,

pobre ou terrível que lhe deres:

Trouxeste a chave?

"No Egito, as bibliotecas erma chamadas de Tesouro dos remédios da alma; de fato, nelas cura-se a ignorância, a mais perigosa das enfermidades e a que dá origem a todas as outra!"
                                                                                   (Jacques Benigne Bossuet)

A postagens sobre os poemas marca o inicio das aulas de informática.